EX-LÍDER REBELDE TUAREG LANÇA INICIATIVA DE CONTRAGOLPE NO NÍGER

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Um líder político e ex-comandante rebelde anunciou a criação de um movimento de resistência à junta militar que assumiu o Governo no Níger a 26 de Julho.

Em comunicado, Rhissa Ag Boula, de 66 anos, afirmou que o seu novo Conselho da Resistência da República (CRR), pretende reinstalar o presidente do país, Mohammed Bazoum, deposto pelo golpe militar de Julho e que tem estado sob prisão domiciliária desde então.

“O Níger está a ser vítima de uma tragédia, orquestrada por aqueles a quem cabia protegê-lo”, refere o comunicado.

Este é principal sinal de resistência interna no Níger nos últimos 15 dias e poderá dever-se à influência ocidental, que pretende o regresso da ordem constitucional num dos mais importantes países do Sahel.

Pouco depois da publicação do comunicado do CRR, o representante da junta, Amadou Abdramane, acusou numa mensagem vídeo a França, ex-potência colonial, de ter violado o espaço aéreo do Níger, como parte de um plano mais vasto para desestabilizar o país, sem contudo apresentar provas.

A acusação é mais um sinal de resistência dos líderes do golpe a qualquer esforço diplomático para repor a ordem, depois do novo governo militar ter negado terça-feira a entrada da missão de paz conjunta enviada pela União Africana e pela CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental).

Os chefes de Estado da CEDEAO reúnem esta quinta-feira em cimeira para debater o possível uso de força no Níger.

A importância dos Tuareg

O comunicado de Ag Boula, publicado em língua francesa, afirma que apoia todos aqueles, incluindo a CEDEAO, que pretendam repor a ordem institucional, acrescentando que está à disposição do bloco para o que for necessário.

Um outro membro do CRR afirmou à Al Jazeera que diversas figuras políticas de peso se juntaram ao grupo apesar de não o poderem fazer de forma pública por razões de segurança.

Apesar deste alegado apoio, a extensão da influência do CRR em eventuais iniciativas contra a junta permanece uma incógnita.

Ag Boula desempenhou um papel chave na revolta Tuareg dos anos 1990 e 2000, quando este grupo étnico, que representa cerca de 10 por cento da população nigeriana mas que é dominante no norte desértico do Níger, se revoltou contra limites impostos pela capital, Niamey.

Tal como diversos outros comandantes rebeldes, Boula acabou por ser integrado nas forças armadas do Níger sob o Presidente Mahamadou Issoufou e o seu delfim e sucessor, Bazoum.

O comunicado de Ag Boula é contudo uma pedra no sapato dos militares que assumiram o poder, sobretudo devido à influência do ex-líder rebelde junto da comunidade Tuareg, que controla o comércio e a agenda política do norte do país.

O apoio dos Tuareg é crucial para garantir o controlo militar do Governo para além dos limites de Niamey.
Intervenção armada em cima da mesa

O Presidente da Nigéria e secretário-geral da CEDEAO, Bola Tinubu, impôs entretanto novas sanções ao Níger e às personalidades e entidades envolvidas no golpe. Acrescentou que todas as hipóteses se mantêm em cima da mesa.

A CEDEAO tem afirmado que o recurso à força só irá surgir depois de se esgotarem todas as vias de diálogo, mas os líderes militares do bloco já estabeleceram um plano de ação armada, que estará em cima da mesa esta quinta-feira na capital nigeriana, Abouja.

A hipótese de uma ação militar conjunta por parte da CEDEAO é contudo remota, depois do Mali e do Burkina Faso terem prometido defender os militares do Níger de qualquer tentativa de os remover pela força, a qual considerariam um ato de guerra.

Numa carta enviada às Nações Unidas, apelaram a uma intervenção contra uma operação armada no Níger, invocando as ameaças de dissolução da CEDEAO, de um desastre humanitário e do agravamento da situação securitária na área.

Os governos de ambos estes países-membros da CEDEAO foram derrubados pela força nos últimos três anos e têm rejeitado desde então a influência ocidental.

Acusaram agora os poderes ocidentais de usarem a CEDEAO como fachada para esconder uma agenda hostil ao Níger, enquanto sublinhavam o seu compromisso no desenvolvimento de soluções para a crise pela via diplomática e negociações.
Mais uma guerra por procuração

Oficiosamente, o golpe militar deveu-se à tentativa de Bazoum, que assumiu o poder em 2021, limitar a influência de diversos homens poderosos do país nos setores público e militar, ligados a Issoufou.

Ao ver chegada a sua vez de ser afastado, o General Abdourahamane Tiani, líder da poderosa guarda presidencial, antecipou-se e deteve Bazoum. Os restantes líderes militares do país terão alinhado com o golpe para evitar derramamento de sangue.

Diversos observadores internacionais vêm contudo mão russa no golpe militar no Níger, num cenário de influência crescente de Moscovo no Sahel. Admitem a possibilidade do grupo paramilitar russo Wagner vir mesmo a substituir no país as forças de paz ocidentais, oriundas dos Estados Unidos, de França, da Alemanha e da Itália.

Os líderes dos governos democráticos que integram a CEDEAO, tal como a Nigéria, exigem o regresso do executivo civil do Níger, o qual, com apoio de tropas francesas e norte-americanas, estava a obter algum sucesso no combate a grupos islamitas armados, como a al-Qaida ou o ISIL (ISIS), o Estado Islâmico, que têm devastado a região do Sahel.

Os militares amotinados que assumiram o poder e detiveram Bazoum em 26 de Julho afirmam que irão defender melhor o Níger da violência causada por estes grupos.

NÍGER

 

O Níger é importante para o mercado mundial em diversos sectores, incluindo no fornecimento de urânio enquanto quinto produtor mundial, apesar de ser igualmente uma das nações mais pobres do mundo.

O golpe militar levou ao encerramento das fronteiras terrestres e aéreas do país, cortando o fornecimento de apoio médico e de mantimentos cruciais para a sobrevivência de grande parte da população.

A comunidade internacional, para quem o Níger era um dos últimos aliados democráticos na região contra a ameaça crescente de grupos armados, foi apanhada de surpresa pelo golpe e está ainda a tentar reagir.

O Presidente norte-americano, Joe Biden, anunciou terça-feira que telefonou a Bazoum para lhe garantir todos os esforços para uma solução pacífica para a crise e a sua libertação.

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