SUDÃO É O PAÍS COM MAIOR NÚMERO DE DESLOCADOS EM ÁFRICA

Dois anos após o início dos conflitos no Sudão, o país rico em ouro, petróleo e produção de algodão de alta qualidade, mergulhou numa guerra que, segundo a ACNUR, fez com que quase treze milhões de pessoas deixassem as suas residências. A resolução das desavenças naquele país do Sahel foi eleita pelo presidente da União Africana, João Lourenço, como prioridade, durante a sua gestão, com término em Fevereiro de 2026. A organização continental compartilha os mesmos objectivos da ONU: estabelecer um cessar-fogo e unir o exército e a RSF, para que os deslocados possam regressar às suas casas, esforços postos à prova pela disputa do poder entre os militares.
Há três semanas, a capital do Sudão, Cartum, foi recuperada pelas forças armadas daquele país do nordeste africano, naquilo que parecia ser o início do fim de um conflito que já dura dois anos, com mais de 150 mil mortos e um total de 50 mil desaparecidos.
Em causa, está a disputa entre o general Abdel Fattah al-Burhan, chefe das forças armadas e presidente do país, e o seu vice, líder das Forças de Apoio Rápido (RSF), Gen Mohamed Hamdan Dagalo, também conhecido por “Hemedti”.
Sobre a mesa, discordância em relação aos rumos a se dar ao país e entrega do poder a um Governo civil, com a integração dos cem mil homens da RSF no actual exército.
Durante a frágil transição política que se seguiu à queda do presidente Omar al-Bashir, em 2019, os generais Burhan e Dagalo forjaram uma aliança de conveniência para expulsar figuras civis do Governo, antes que uma forte luta pelo poder os colocasse em lados opostos e terminasse em guerra aberta.
Com 46 milhões de habitantes, em 2022, o Sudão, mesmo antes do início do conflito, a 15 de Março de 2023, já era dos países mais pobres do mundo, não obstante ter uma economia diversificada, com destaque para o ouro, que é o principal produto de exportação, representando 70 por cento do total das exportações do país, e o petróleo, responsável por mais de metade das receitas totais do Governo sudanês.
O Sudão tem, ainda, a pecuária como a segunda maior fonte de exportação e o algodão, reconhecido pela alta qualidade, devido à diversidade de solos e métodos de irrigação.
Somente em 2022, àquele país exportou cerca de 379 milhões de dólares em algodão cru, sendo o décimo maior exportador mundial, tendo como principais destinos a Turquia, Egipto, Paquistão, China e Índia.
Contudo, a guerra dividiu o país, o terceiro maior de África, em dois: o exército controla o norte e o leste, enquanto as RSF dominam uma parte do sul e a quase totalidade da vasta região do Darfur, a oeste, na fronteira com o Chade.
Como consequência, no início de Março, a Organização das Nações Unidas (ONU) emitiu um alerta para o risco de uma nova escalada da guerra naquele país do Sahel, afirmando que há receios reais de um aumento de mortes por fome em larga escala.
As condições de fome já foram relatadas em pelo menos cinco locais no Sudão, incluindo campos de deslocados em Darfur, de acordo com as Nações Unidas.
Tanto as RSF, como o exército, foram acusados de atrocidades e os seus dirigentes estão sujeitos a sanções norte-americanas, sendo que em Janeiro deste ano, Washington acusou formalmente as RSF de “genocídio”.
No seu discurso enquanto Presidente do MPLA, em Dezembro de 2024, em Luanda, João Lourenço afirmou ter eleito a situação no Sudão para o “topo das prioridades” da sua agenda de trabalho quando assumisse a presidência da União Africana, em Fevereiro de 2025.
“A situação no Sudão estará no topo das prioridades da minha agenda, logo que assumir a presidência da União Africana″, disse João Lourenço, promessa essa que voltou a reafirmar aquando da sua tomada de posse como líder da organização continental.
Desde então, a União Africana tem alinhado com a Organização das Nações Unidas na mesma meta: estabelecer um cessar-fogo e unir o exército e a RSF.
Há um mês, a intenção de criação de um governo paralelo no Sudão, anunciada pelo grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido, que combate o exército sudanês, foi condenada pelo Conselho de Paz e Segurança da União Africana (UA).
A meio de uma guerra devastadora, que não dá tréguas, desde Abril de 2023, o conselho “expressou a sua profunda preocupação e condenou veementemente os recentes desenvolvimentos no Sudão, em particular o anúncio das RSF e suas forças políticas e sociais afiliadas sobre o estabelecimento de um governo paralelo na República do Sudão, e advertiu que tal ação acarreta um enorme risco de divisão do país”, disse o órgão com sede em Adis Abeba, num comunicado após realizar uma reunião virtual.
De acordo com informações, a UA emitiu a nota depois de as RSF e 23 outros grupos políticos e militares terem chegado a um acordo básico em Nairobi, na madrugada de 23 de Fevereiro, para formar o governo paralelo, antes de assinarem uma Constituição de transição para o país, em 04 de Março.
Enquanto isso, segundo dados da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), quase 13 milhões de pessoas deixaram as suas casas até agora, com quase quatro milhões de sudaneses cruzando para os países vizinhos Egipto, Sudão do Sul, Chade, Líbia, Etiópia, República Centro-Africana e mais além, para o Uganda.
“O deslocamento continuou a crescer no segundo ano do conflito, com mais de um milhão de pessoas fugindo do Sudão. As pessoas que buscam protecção internacional relatam experiências de violência sexual sistêmica e outras violações dos direitos humanos, além de testemunhar massacres. Metade são crianças, incluindo milhares desacompanhadas, sem qualquer família. O Sudão é agora o país com o maior número de pessoas deslocadas como refugiados na África”, afirmou a agência da ONU.