ALGUÉM QUE SE ALIA À CORRUPÇÃO PODE PRETENDER COMBATER A CORRUPÇÃO? – CARLOS ALBERTO

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Estive a ler uma opinião do secretário-geral da UNITA, Álvaro Daniel, na edição de sexta-feira, 19 de Maio, do jornal “OPAÍS”, segundo a qual “a UNITA defende a criação de uma Alta Autoridade Nacional Contra a Corrupção, que integre entidades de reconhecida idoneidade e descomprometidas com os que detêm o poder” – eu acrescentaria “descomprometidas com os que detêm o poder e igualmente equidistantes com os políticos na oposição e sociedade civil”.

Angola podia criar essa e outras instituições que pudessem de facto combater a corrupção, sem olhar para a cor dos olhos dos actores, se for este o entendimento de quem está no poder, mas a UNITA parte de uma premissa que não mostra transparência, a partir do momento em que acha que corrupção só acontece “nos que detêm o poder”.

Na oposição (na UNITA), nós vemos políticos que ostentam bens acima do seu rendimento. E isso são sinais também de corrupção. Devem ser igualmente investigados, tal como todos do MPLA, e da sociedade civil (aqui inclui-se também jornalistas, juristas, bancários, académicos, etc.), que mostrem sinais de uma riqueza com origem duvidosa.

Os três países que mais evoluíram no combate à corrupção em África, nos últimos 10 anos – Ruanda, Botswana e Cabo Verde – implementaram várias medidas para combater a corrupção, incluindo o estabelecimento de órgãos especializados, como “Comissão de Ética e Combate à Corrupção”, “Tribunal especializado para casos de corrupção”, “Código de Conduta para Funcionários Públicos”, “Programas de Transparência e Prestação de Contas” e “Programas de Conscientização e Educação da População”.

Ruanda, Botswana e Cabo Verde implementaram essas medidas contra tudo e todos. Não se referiram apenas a políticos que estavam no poder. Eles olharam para a Nação acima dos políticos.

A UNITA parte várias vezes de premissas político-partidárias – só a olhar para o seu interesse em ser Governo, pois “pessoas que detêm o poder” hoje (2023) são do MPLA e amanhã (2027/2032) se a UNITA for Governo também se vai olhar só para corrupção de “pessoas que detêm o poder” (no caso só políticos da UNITA)? Claro que não. Até os do MPLA que estiverem na oposição – estou a falar por hipóteses – devem ser alvos de investigação de casos de corrupção. Logo, a premissa da UNITA está errada. É uma premissa que não é nacional. Não olha para interesses da Nação acima dos seus próprios. É preciso que a UNITA dê sugestões a olhar também para o seu umbigo, que pode ser igualmente feio, porque “santa” não é. É só olharmos para determinados generais da UNITA que têm bens acima do seu rendimento. Têm fazendas com dimensões inexplicáveis, mansões, casas no Mussulo, etc., e os jornalistas e opinion makers, estranhamente, só olham para quem é do MPLA para falar de corrupção.

Aliás, na última campanha eleitoral – e eu chamei atenção sobre isso na TPA, enquanto comentador -, todos vimos que o partido UNITA se juntou a pessoas que manifestamente entraram na corrupção no tempo de José Eduardo dos Santos. E muitos acharam isso normal porque a ideia que se criou é “tirar o MPLA do poder a qualquer custo”. Essa ideia, per si, é corrupta. Não agrega valores à sociedade. Deve-se tirar o MPLA do poder com autoridade moral. Se a oposição entra na imoralidade para tirar o seu rival do poder não serve para uma Nação séria.

A filha de JES, Tchizé Dos Santos, até veio a público dizer, de forma categórica, que apoiou (e procurou apoios) Adalberto Costa Júnior para se tornar Presidente da República e mostrou o seu descontentamento pelo facto de o líder da UNITA ter aceitado entrar no Parlamento, aceitando os resultados eleitorais a favor do MPLA/João Lourenço.

Estou com isso a dizer que um partido na oposição que se alia a pessoas que delapidaram este país perde, também, autoridade moral para defender a criação de uma “Alta Autoridade Nacional Contra a Corrupção”. A ideia não é de toda errada. O problema está na premissa (partidária) e na falta de autoridade moral da UNITA para falar em “Combate à Corrupção”.

Um gatuno, por exemplo, não pode vir a público dizer que pretende combater roubos. É um paradoxo!

É justamente por isso que venho chamando atenção aos políticos da oposição que “na política, não pode valer tudo”. A ideia de se tirar o MPLA do poder “a qualquer custo” é muito perigosa e traiçoeira.

Todos podem sonhar chegar ao poder mas as vias para lá chegar devem ser trilhadas com sentido de Estado, com responsabilidade pública, para que tenham autoridade moral para criticar quem está/esteve no Governo.

No nosso país, faltam-nos pessoas (incluindo políticos da oposição) com autoridade moral.

Nós criámos falsas referências em todos os sectores da vida pública. Crescemos com muita mentira (incluindo nos partidos da oposição).

Quem são os angolanos com idoneidade reconhecida que podiam integrar essa “Alta Autoridade Nacional Contra a Corrupção”? Quem tem esse perfil em Angola? Os da UNITA?

Um Combate à Corrupção (sério) ultrapassa os partidos políticos.

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