MBANZA KONGO: A CIDADE ONDE OS SONHOS ESTACIONAM NAS MOTAS

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Mbanza Kongo, antiga capital do reino mais sábio da África Central, berço da diplomacia antes da colonização, hoje é uma cidade onde os sonhos universitários acabam no volante de uma motorizada ou atrás de um banco de saldos.

Aqui, os diplomas não abrem portas – empurram para a rua.

Nas praças, cruzamo-nos com jovens de bata limpa, caligrafia fina e ideias brilhantes, que hoje são conhecidos como “kupapata” ou “mototáxi”. São engenheiros sem obra, professores sem sala, administradores sem repartição. São licenciados com fome, vendendo recargas, saldos e esperança. Alguns até guardam o diploma dentro da mochila enquanto correm de cliente em cliente, como se ainda esperassem que, num dia qualquer, o país se lembrasse que eles estudaram.

A universidade não é mais uma escada social – é um beco sem saída.

Estudar em Mbanza Kongo tornou-se um risco emocional: quanto mais se aprende, mais se sofre. A juventude local cresce ouvindo que “o saber não ocupa lugar”, mas vive o drama de ver o saber ocupar as ruas, os mercados, as oficinas improvisadas. Cada esquadra de mototáxi é uma assembleia silenciosa de cérebros frustrados.

O mais doloroso é que a culpa não é deles.

É de um sistema que ensina, mas não emprega. Que forma, mas não absorve. Que promete, mas não cumpre.

As autoridades falam de “empreendedorismo juvenil” como se fosse um remédio universal. Mas onde está o capital inicial? Onde estão as feiras de crédito? Onde estão os incentivos locais? Empreender, aqui, é sinónimo de sobreviver: com um fardo de saldos ao ombro, um fogareiro emprestado, ou uma motorizada alugada a 7.000 kwanzas por dia.

Em Mbanza Kongo, a juventude aprendeu a não esperar nada do Estado.

Aprendeu a improvisar, a negociar, a correr atrás. Mas até quando?

Até quando um jovem que dedicou cinco anos à universidade será empurrado para o mesmo destino de quem foi expulso no nono ano?

A cidade, que um dia foi símbolo de sabedoria, é hoje palco de exclusão institucionalizada.

Não falta inteligência — falta justiça social.

Não falta juventude — falta dignidade.

E a ausência de políticas concretas transforma Mbanza Kongo numa vitrine do fracasso estatal: uma cidade onde o passado brilha mais do que o futuro.

EPÍLOGO: O MOTOR QUE AINDA QUEIMA

Mas nem tudo está perdido. Em cada motoqueiro com diploma, arde uma pequena revolta. Em cada vendedor de saldo com visão, vive uma crítica silenciosa ao sistema. Eles ainda acreditam — mesmo feridos. Porque, apesar de tudo, Mbanza Kongo continua a ser uma terra de reis.

E os reis, mesmo humilhados, não esquecem o trono.

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