PAULINA CHIZIANE PEDE DESCOLONIZAÇÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA
A escritora moçambicana Paulina Chiziane recebeu nesta sexta-feira, 5, Dia Mundial da Lingua Portuguesa o Prémio Camões 2021 em Lisboa, com um discurso em que destacou a honra que sentia por estar entre personalidades da política, vinda de uma origem simples, e pediu a descolonização da língua portuguesa.
“Para quem vem do chão, estar aqui diante do Governo português, do Governo brasileiro, do corpo diplomático e de várias personalidades é algo que me comove profundamente”, afirmou Chiziane, quem reconheceu ter caminhado “sem saber para onde ia, mas cheguei a algum lugar, que é este prémio”.
Ela lembrou ter aprendido a escrever na areia e que recebeu o seu primeiro par de sapatos aos 10 anos de idade, num distante Moçambique quando visto do Ocidente.
“Somos usurpados, os africanos, por estes e por aqueles, porque os rastros da nossa história foram apagados através dos tempos. Estamos à deriva, não sabemos bem quem somos e, por isso, somos facilmente manipulados pelo mundo. O autoconhecimento tem de ser a chave para o sucesso de quem quer que seja”, assinalou Chiziane, quem, nos agradecimentos, destacou os seus leitores, “em Moçambique e em todos os países que falam português”.
Numa referência à língua portuguesa, Paulina Chiziane disse que para ser de todos que a falam, como ela, merece um “tratamento, limpeza, descolonização”
Ao citar palavras do dicionário, ela afirmou que se assusta com “algumas especificidades”, como a palavra catinga, “que vem como cheiro nauseabundo característico da raça negra”.
Chiziane nomeou também matriarcado, que aparece definido como “costume tribal africano”, em contraposição com patriarcado, “tradição heróica dos patriarcas”.
“Em África temos matriarcado, sobretudo na região norte de Moçambique. É um costume tribal, deita fora, é coisa de africano. Mas patriarcado já tem valor. Que machismo é esse?”, questionou a escritora, quem confessou: ““Fico muito triste quando olho para aquilo. Será que tivemos tempo de olhar para estas questões?”.
Chiziane afirmou que é na língua portuguesa “que eu expresso os meus sentimentos e me afirmo diante do mundo, mas eu gostaria que a língua fosse de todos”.
Entretanto, enfatizou”que a eu língua portuguesa, para ser definitivamente nossa, precisa de um tratamento, de uma limpeza, de uma descolonização”..
O Prémio Camões de literatura em língua portuguesa é uma iniciativa conjunta de Portugal e do Brasil e é atribuído anualmente desde 1988, firmando-se, desde então, como maior distinção da literatura em língua portuguesa.
Cada vencedor recebe 100 mil euro e o júri é sempre composto por seis elementos: dois do Brasil, dois de Portugal e dois de países africanos
Anunciada como vencedora do prémio em Outubro de 2021, Paulina Chiziane demorou a receber oficialmente o prémio devido à decisão do então Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, de recusar assinar o Prémio Chico Buarque, de 2019, bloqueando assim todas as entregas sequintes.
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