O PGR E A SEMÂNTICA
De acordo com fontes convergentes, o general Fernando Hélder Pitta Gróz teria negado as acusações de ser um “oficial às ordens” do Presidente da República, de quem receberia directivas de e como agir em determinados processos.
Pitta Gróz feria feito tais declarações logo após ser empossado pelo Presidente da República para o seu segundo mandato como Procurador Geral da República.
De acordo com fontes convergentes, Pitta Gróz teria afirmado, na quarta-feira, não serem verdadeiras as acusações segundo as quais a Procuradoria Geral da República recebe ordens directas do Presidente da República, João Lourenço, na condição de Chefe do Executivo, sobre como deve atuar em certos casos.
O reconduzido PGR teria jurado, também, nunca ter recebido “orientações de membros de nenhum partido político sobre o que deve fazer no exercício das suas funções”.
«Aqui é um falso problema, porque a lei diz que a Procuradoria da República recebe orientações do Titular do Poder Executivo somente naqueles casos em que há intervenção do Executivo numa das qualidades do processo. Ora, se o Titular do Poder Executivo for constituído arguido num processo, é natural que ele como arguido e a Procuradoria-Geral da República como o seu advogado queira saber o quê, que a pessoa em causa quer que seja feita a sua defesa», teria dito.
Considerada por muitos como língua difícil, o português é, na verdade, um idioma que se presta a muitas e díspares interpretações.
Pitta Gróz, que deve a sua recondução à insondáveis razões, assume que “a Procuradoria da República recebe orientações do Titular do Poder Executivo somente naqueles casos em que há intervenção do Executivo numa das qualidades do processo”.
O n.º 3 do Artigo 8º da Lei nº 22/12, de 14 de Agosto (Lei Orgânica da Procuradoria Geral da República e do Ministério Público) estabelece que o “Procurador-Geral da República recebe instruções directas do Presidente da República, no âmbito da representação do Estado pela Procuradoria-Geral da República”.
Qualquer dicionário da língua portuguesa dirá ao general Pitta Gróz que orientações e instruções não são sinónimas.
De acordo com o também chamado mestre mundo, por orientações deve entender-se uma informação a alguém sobre “aquilo que ignora e deseja saber ou dirigir e encaminhar alguém ou algo em direcção a um determinado local ou lugar”.
Do descumprimento de uma orientação não decorre nenhuma sanção.
Já a instrução é uma ordem, uma prescrição ditada por uma entidade hierarquicamente superior e de cujo descumprimento decorre, geralmente, uma sanção.
Ao Procurador-Geral da República não é facultativo o cumprimento de uma instrução do Presidente da República.
A Pitta Gróz também são atribuídas afirmações de acordo com as quais nunca recebeu “orientações de membros de nenhum partido político sobre o que deve fazer no exercício das suas funções”.
Sucede que a entidade de quem Pitta Gróz recebe “instruções directas” é, simultaneamente, Presidente da República, Titular do Poder Executivo e presidente do MPLA.
Quando vai ao palácio presidencial receber “instruções directas”, alguma vez ocorreu a Pitta Gróz perguntar ao seu interlocutor na qualidade de quê lhe dá “o manual” para agir em cada caso?
Desengane-se o PGR: a sua relação com o Presidente da República é vertical; as instruções que o Presidente da República dá não são de cumprimento facultativo. Há consequências para o seu descumprimento.
Ao reconduzido Procurador-Geral da República fará muito bem aproximar-se mais da semântica.
Como nota final, não seria de todo desaconselhável que o PGR relesse o n.º 3 do Artigo 8º da Lei nº 22/12 quanto mais não seja para acabar com a confusão que faz entre as figuras do Presidente da República e a de Titular do Poder Executivo.
Nos termos daquele artigo, Pitta Gróz recebe instruções directas do Presidente da República da República. A lenga-lenga de que “a lei diz que a Procuradoria da República recebe orientações do Titular do Poder Executivo” é invenção do PGR. Não está em lei alguma.